segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Cultura Japonesa! Teatro Kabuki e a Arte do Onnagata



Kabuki (歌舞伎) é uma das formas de teatro japonês mais famosas no mundo, conhecida pela estilização do drama e pela elaborada maquiagem usada por seus atores. O significado individual de cada ideograma é canto (ka) (歌), dança (bu) (舞) e habilidade (ki) (伎), e por isso a palavra kabuki é às vezes traduzida como “a arte de cantar e dançar”. Esses ideogramas, entretanto, são o que se chama de ateji (ideogramas usados apenas com sentido fonético) e não refletem a etimologia mesma da palavra. Acredita-se, de fato, que kabuki derive do verbo kabuku, significando aproximadamente “ser fora do comum”, de onde se depreende o sentido de teatro de “vanguarda” ou teatro “bizarro”. Sua origem remonta ao início do século XVII, quando se parodiavam temas religiosos com danças de ousada sensualidade. No ano de 1629, esse tipo de teatro foi proibido pelo governo. O espetáculo passou a ser encenado então por rapazes que se vestiam de mulher. Contemporaneamente, o teatro kabuki se tornou um espetáculo popular que combina realismo e formalismo, música e dança, mímica, encenação e figurinos, implicando numa constante integração entre os atores e a platéia.


1603-1629: kabuki feminino (onna kabuki)

A história do kabuki começou em 1603, quando Okuni, uma miko (jovem serviçal dos santuários xintoístas) do santuário (taisha) Izumo, passou a executar um novo estilo de dança dramática em Kyoto. Atrizes representavam papéis tanto masculinos quanto femininos em encenações cômicas sobre a vida cotidiana. O estilo conquistou popularidade instantânea; Okuni foi inclusive convidada para se apresentar na Corte Imperial. No despertar de tal sucesso, trupes rivais se formaram rapidamente e o kabuki nasceu como uma dança dramática de conjunto executada por mulheres, uma forma muito diferente de sua representação moderna. Muito do seu apelo era devido às sensuais e sugestivas performances; assim muitas eram disponíveis para os membros da platéia que pudessem pagar e, finalmente o kabuki surgiu em 1603 para nossa alegria.


1673-1735: A era Genroku

Durante a era Genroku o kabuki floresceu. A estrutura das peças kabuki foi formalizada nesse período, assim como muitos elementos de estilização. Os tipos convencionais de personagens foram determinados. O teatro kabuki e o ningyô jôruri – forma elaborada de teatro de bonecos que veio a ser conhecida mais tarde como ''bunraku'' – tornaram-se estreitamente associados um com o outro nessa época e desde então têm-se influenciado mutuamente em seus desenvolvimentos. O famoso dramaturgo Chikamatsu Monzaemon, um dos primeiros a escrever textos dramáticos de kabuki profissionalmente, produziu muitos trabalhos influentes, embora a peça tida como mais significativa de sua obra, Sonezaki Shinju (Os suicídios de amor em Sonezaki), tenha sido originalmente escrita para bunraku. Como muitas outras peças de bunraku, entretanto, essa foi adaptada para kabuki e inspirou muitos “imitadores”; de fato, conta-se que essa e outras peças similares causaram tantos casos reais de suicídio copiados do drama, que o governo proibiu as shinju mono (peças sobre suicídio duplo de amantes - aliás, curiosa semelhança com Romeu e Julieta) em 1723. Ichikawa Danjuro nono também viveu nessa época. A ele se atribui o desenvolvimento das poses mie e da maquiagem kumadori, que simulava máscaras. Em meados do século XVIII o kabuki perdeu temporariamente a preferência do público das classes mais baixas em favor do bunraku. Isso aconteceu em parte por causa da emergência de muitos bons dramaturgos de bunraku na época.. Nada digno de nota aconteceu no desenvolvimento do kabuki, até o fim do século, quando a forma voltou a emergir.


Kabuki após a Restauração Meiji

As grandes mudanças culturais começaram em 1868, com queda do xogunato Tokugawa. A supressão da classe dos samurais e a abertura do Japão para o ocidente ajudaram a ativar esse reflorescimento. Como a cultura lutava para se adaptar à nova situação de não-isolamento, os atores batalharam para elevar a reputação do kabuki entre as classes mais altas e para adaptar os estilos tradicionais aos novos gostos. Muitas casas de kabuki foram destruídas por bombardeios durante a Segunda Guerra Mundial e as forças de ocupação baniram as apresentações de kabuki por um breve período depois da guerra. Em 1947, no entanto, a proibição já havia sido revogada e as apresentações recomeçaram.

O Kabuki hoje em dia
No Japão moderno, o kabuki continua relativamente em voga. É o mais popular dos estilos tradicionais de drama japonês. Seus atores mais famosos fazem também papéis na TV e no cinema. Por exemplo, Bando Tamasaburo V, um onnagata bem conhecido, apareceu em diversas peças (não de kabuki) e filmes, geralmente em papéis femininos. Algumas trupes de kabuki usam atualmente atrizes nos papéis de onnagata. O Ichikawa Kabuki-za, por exemplo, é uma trupe só de mulheres formada depois da Segunda Guerra. Em 2003 uma estátua de Okuni foi construída perto de Kyoto, onde ocorreu em 24 de novembro de 2005, a "Terceira Proclamação das Obras-Primas da Herança Oral e Intangível da Humanidade" da UNESCO.


Elementos do kabuki

Hanamichi (lit. "caminho florido") é uma seção extra usada no palco do kabuki. Consiste numa plataforma comprida e elevada, à esquerda do centro, que leva do fundo do teatro, pelo meio da platéia, até o palco principal. Geralmente é usada para entrada e saída de personagens, embora possa também servir para solilóquios e cenas paralelas à ação principal. O hanamichi foi usado pela primeira vez em 1668 no Kawarazakiza, na forma de um palanque de madeira simples, que não era usado na encenação mas que permitia que os atores fossem até a platéia para receber flores. O estilo moderno de hanamichi, às vezes chamado honhanamichi (“caminho das flores principal”), tem dimensões padronizadas e foi concebido originalmente em 1740. Alguns teatros começaram a fazer uso de um hanamichi secundário, no lado direito da platéia, com metade da largura do honhanamichi à esquerda. Embora seja raramente usado para as ações principais de uma peça, muitos dos mais dramáticos ou famosos momentos dos personagens ocorrem durante as entradas ou saídas pelo hanamichi, e uma vez que atravessa a platéia, isso proporciona ao espectador uma experiência mais íntima do que a que normalmente ocorre em outras formas de teatro tradicional. Os palcos e teatros de kabuki tornaram-se mais tecnologicamente sofisticados. Inovações como palco giratório e cortinas, introduzidas no século XVIII, incrementaram bastante a cenografia dos espetáculos de kabuki.

No kabuki, como em alguns outros gêneros de artes cênicas japonesas, as trocas de cenário são feitas no meio da cena, com os atores no palco e as cortinas abertas. Contra-regras correm pelo palco colocando e tirando as peças de cenário; esses contra-regras, conhecidos como kuroko, vestem-se sempre de preto e são tradicionalmente considerados “invisíveis”.

Há três categorias principais de peças kabuki: jidai-mono (peças “históricas” ou anteriores ao período Sengoku) , sewa-mono (“domésticas” ou pós-Sengoku) e shosagoto (peças de dança). São características importantes do kabuki: Os mie e a maquiagem. Os mie são poses pitorescas que o ator sustenta para compor seu personagem. 

O que realça a presença dos artistas kabuki é a maquiagem altamente estilizada, marcando os contornos dos olhos, os cílios e a boca. Cada cor está ligada a uma simbologia que representa o temperamento do personagem, assim como o branco é usado por mulheres e jovens apaixonadas, o vermelho retrata a ira e a cólera, o cinza a melancolia, azul-preto os vilões e o verde os espíritos diabólicos e visitantes de outro mundo. 

A vestimenta participa desse conjunto multicor ajudando a caracterizar o ator kabuki. Tudo é absurdamente exagerado o que o torna mais atraente. O choque visual não se limita somente a esses parâmetros; a mímica possui força de expressão, os movimentos são feitos em cadência com alto nível de perfeição sugestiva culminando em uma pose dinâmica de equilibrada força e beleza conhecida como “Mie”. Mie significa "aparência" ou "visível", em japonês. É um momento em que o ator pára congelado numa pose. O propósito é expressar o auge das emoções de um personagem. Os olhos do ator se abrem o máximo possível; A maquiagem (ou keshô) é um elemento do estilo facilmente reconhecível, mesmo por quem não está familiarizado com esta forma de arte. O pó-de-arroz é usado para criar a base branca oshiroi. O kumadori acentua ou exagera as linhas faciais para produzir as máscaras dramáticas usadas pelos atores, de expressões sobrenaturais ou animalescas.

Onnagata ou oyama ( japonês :女形·女方, "forma de mulher")
São atores do sexo masculino que personificam as mulheres. O kabuki onnagata moderno foi originalmente conhecida como Yaro Kabuki (homem kabuki) para distingui-lo de formas anteriores. Originalmente o onnagata era feito por mulheres, mas em 1629 a participação feminina foi proibida devido à grande prevalência da prostituição e pela brutal rivalidade entre as trupes. Nesta época nasceu a encenação pela Wakashu, garotos adolescentes que encenavam os dois papéis.  

Em 1642, os papéis de onnagata foram proibidos, resultando em peças com apenas personagens masculinos. Essas peças continuaram a ter cunho erótico e em muitas vezes tratavam de temas nanshoku (homossexualidade masculina).

O verdadeiro kabuki como conhecemos hoje surgiu posteriormente formado somente por homens. A arte de se transformar em mulher foi criada na época em que atores especializavam-se nessa modalidade. A beleza de “Onnagata” obedeceu a um padrão idealizado por homens, ou a forma de como a mulher devia portar-se. Aquela feminilidade exagerada não é natural do desempenho de uma mulher, mas calcada em certos conceitos da observação masculina. Na Inglaterra da Idade Média, os atores das peças Sheakesperiana também tinham que se travestir-se de mulheres, não sendo, portanto uma característica unicamente do Japão.

Confiram alguns videos dessa belissima arte que ainda sobrevive como um estilo prórpio de beleza e sensibilidade!

Video de um dos maiores representantes desta arte na atualidade: Taichi Saotome.




Neste video podemos ver uma participação especial deste grande ator de kabuki no programa de fim de ano da TV NHK Kouhaku Utagasen junto da cantora Sakamoto Fuyumi, com a canção "Yoizakura Oshichi".

Um comentário:

  1. Simplesmente fantástico o Teatro Kabuki. Assisti a uma performance do Bando Tamasaburo reinterpretando a cena do baile de Shyio, do filme Memórias de uma Gueixa. É de uma beleza estética profunda e tocante! Gostei muito do seu texto, muito didático e interessante. Parabéns!!

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